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Que futuro desejamos?

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Fundadora do Núcleo de Estudos do Futuro da PUC, convidada da ONU para trabalhos que envolvem economia criativa e assessora de ONGs respeitáveis, Lala Deheinzelin fala sobre a diferença entre um futuro provável e outro desejável. E usa lentes 4D para explicar

“Quando olhamos para o passado percebemos que desejamos o futuro que temos hoje. Queríamos drive-thru, celulares, carros e mais carros, prédios e mais prédios”, diz Lala Deheinzelin. Esse cenário, que teve alguns pedidos insanos, nos gabarita para desejar o que vem pela frente? Na opinião dessa futurista, há espaço para otimismo. “Até porque, ao longo do tempo, as sociedades que floresceram foram as otimistas. As derrotistas desapareceram”, pontua. Lala (diminutivo de Claudia) tem um lastro respeitável para falar o que fala. Foi consultora da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), fundou o Núcleo de Estudos do Futuro da PUC-SP e assessora instituições privadas e governamentais, como o Sebrae, em projetos de economia criativa. Recentemente, foi eleita uma das 100 mulheres do mundo que estão cocriando a sociedade colaborativa. De seu ateliê, com o sugestivo nome Crie Futuros, onde recebeu BONS FLUIDOS, ela contou como sua personalidade multimídia aliada ao talento para buscar soluções (Lala trabalhou como atriz, produtora de eventos e apresentadora do programa Metrópolis, entre outras coisas), a direcionou para a economia criativa. E decifrou uma tal de fluxonomia 4D. Um jeito peculiar de pensar a vida que chama atenção por fazer muito sentido.
Lala, lembro de você como apresentadora do Metrópolis, da TV Cultura. E agora você é consultora de economia. Como aconteceu essa transição? 
[Enquanto liga o fogão e aquece água para um café]. Desde pequenininha eu achava que todos os problemas do mundo eram meu problema. Achei que estudar biologia, história e arqueologia ia me ajudar a entender tudo para, então, poder consertar. Não segui nenhuma dessas três carreiras, mas dessas três disciplinas, resultou uma visão sintética das coisas. Por outro lado, minha avó foi artista, minha mãe e meu pai participaram da criação do TBC, o primeiro emprego da minha mãe foi com o Bardi (diretor-fundador do Masp) e meu pai tinha uma produtora – comecei a ficar em frente à câmera aos 2 anos. Eu lia pra caramba – porque queria salvar o mundo [risos] e porque era muito tímida e gordinha. Foi assim até os 17 anos, quando a dança mudou tudo. Detalhe: calço 40, sou alta e tenho pernas tortas. As professoras de dança diziam que eu não tinha a menor chance na área. Acabei, então, inventando uma linguagem adequada a meu corpo. Fui descobrindo Lalas dentro de mim, fazendo muitas coisas e virei multimídia. Sempre com a certeza do poder transformador da arte. E de como os artistas, paradoxalmente, não ganham bem por isso. 

Aí entra a economia… 
Eu ganhava dinheiro como atriz, assistente de direção do Jayme Monjardim, do Arnaldo Jabor, trabalhei com o José Victor Oliva. Recebi prêmios e uma bolsa da Fundação Vitae [organização de fomento à arte e à cultura presente no Brasil de 1985 a 2005] que me permitiu pesquisar como trabalhar 
o intangível de forma tangível. Como fazer essa ponte entre o sutil e o concreto, a teoria e a prática. Nessa altura estava envolvida com cultura de paz e futurismo, aprendendo como mudar o mundo com visão empreendedora, percebendo qual era o padrão das coisas que funcionavam.
E qual é? 
Nas corporações, vi que os CEOs sabem o poder da linguagem e usam isso para moldar o desejo do consumidor – o futuro se constrói. Em ONGs premiadas [Lala trabalhou no Itaú Social, na Fundação Abrinq e no Instituto Ayrton Senna] vi que cada uma tinha seu jeito de trabalhar, mas que, em todas, havia a crença forte de que há mais possibilidades. Então, com o tempo, fui vendo que o que funcionava numa indústria de beleza séria, numa ONG como o Doutores da Alegria, numa instituição renomada, não era só uma coisa. Eram várias. Mais exatamente quatro: o ambiental, o social, o financeiro e o cultural. Aí começo a lidar com sustentabilidade.
Li que você critica a sustentabilidade baseada no tripé ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável… 
Acho que essa definição nos levou a uma enrascada. Que é o fato de considerarmos valor econômico apenas uma das pernas. Para mim, os valores precisam ser entendidos igualmente – tanto o ambiental, quanto o social, o financeiro e o cultural, que pouca gente considera. Um não funciona sem o outro. Exemplo: se tenho o desejo de fotografar, mas não tenho câmera, não produzo. Se tenho desejo, câmera e conhecimento, mas não tenho um público que quer o 
que faço, não dá certo. Quando tem um furo nessa cadeia o negócio não entra em fluxo, não gera nada. Isso é fluxonomia 4D, porque considera o fluxo em quatro dimensões. 
Traduzindo, fluxonomia 4D é … 
…uma visão integrada, que percebe que os recursos não são só monetários. Pegue a anatomia como exemplo. O osso sustenta, o músculo move, o nervo informa, a circulação dá energia. Podemos ver tudo compartimentalizado, mas, se não integrarmos, não rola. Com a fluxonomia, a ideia é integrar áreas para potencializar recursos. Isso leva a um jeito de pensar que, mais do que analisar o que falta, põe os holofotes no que se tem. 
Santo de casa faz milagre… 
Justamente. Criei um projeto que se chama Santo de Casa Faz Milagre. Eu chegava numa empresa ou comunidade muito carente e perguntava: “O que aqui tem de bom?” Constantemente me respondiam: “Aqui? Aqui não tem nada de bom”. Daí eu dizia que para o santo de casa ser ativado ele precisava saber o que tinha e o que queria melhorar. Parece bobagem, mas isso diferencia um futuro provável de um desejável. 
Pode explicar? 
Vamos ver a questão do aquecimento global que leva à falta d’água. Quando reajo e economizo água, estou criando um futuro provável. Minimizo o problema, tomo banho frio para não gastar energia, mas não invento um banheiro que não seja o de jogar xixi e cocô no rio. Um futuro desejável é o que propõe algo novo: “Galera, o que poderia ser um banheiro diferente? Vamos pensar!” Em vez de carro elétrico, quem sabe usar menos carro? Em vez de prédio verde, quem sabe construir menos prédios, já que há tanto espaço construído ocioso que poderia ser mais bem aproveitado. Quando a gente é criativo amplia o campo de possibilidades. Afinal, o futuro é uma ficção.
E essa ficção pode acabar bem? 
Sim. E não sou só eu quem diz. Em 1961, Fred Polak, o pai dos futuristas, disse que, ao longo do tempo, as sociedades que floresceram foram aquelas com visão otimista. Então, a mensagem é “vai que dá”. Fiz um trabalho com o PNUD em 2002, que consistiu em reunir gente de sucesso em diferentes áreas como o empresário Horácio Lafer Piva, a bailarina Marika Gidali e o carnavalesco Joãosinho Trinta. O que elas tinham em comum? A crença de que ia dar certo. E de que um não vai sem o outro…
O desemprego aumentou, a dívida aumenta. Dá para ser otimista? 
Dá a mão para mim [pede, movimentando meu braço em sua direção]. Se tem algo que puxa você e você vem, ok. Se não vem, há tensão, certo? Pois as crises são fruto da resistência diante de uma mudança de estado. São um rompimento com um jeito de fazer que já não dá mais. Ok, evidente que o cara vai perder o emprego e vai sofrer. Mas vai sofrer ainda mais se não aprender a ficar junto para seguir em frente. 
Você está falando de economia colaborativa… 
É possível dividir o espaço com um amigo, um colega, alguém que tenha a mesma função. É possível a mesma indústria de moda, com equipamen
tos caros, produzir para as marcas x, y e z, trabalhar em turnos, ou ainda, começar a fazer aquela atividade que faltava coragem para dar início. 
Às vezes a solução não está à vista… 
Sim. Sabia que a palavra pânico vem de pan, o Todo? A multiplicidade de opções apavora mesmo. A pessoa pode pensar: “Bem que eu queria mudar de emprego, porque acho isso chato, não me dá retorno pessoal, mas não tem jeito, não dá, eu vou fazer o quê? Não tenho outra profissão”. No fundo, isso acontece porque a gente foi educado a ver o que falta, e não o que temos. Você já deve ter ouvido por aí que inteligente é aquela pessoa que sabe criticar o que falta e não quem observa a possibilidade, não é mesmo? Não saber fazer alianças é outro item que faz toda mudança dar medo. A gente se sente pequeno. Eleve 1 a 5 bilhões. Dá 1. 
Juntar-se é a saída em todos os setores? 
Assim como homem e mulher dão filhinhos, uma coisa mais outra dá uma terceira. Imagine a situação: eu não consigo mais pagar aluguel. Pois bem, e se colocar um quarto meu no Airb&b para estudante? E se anunciar para meus amigos que estou alugando o quarto? Ou se eu mesmo for morar com um amigo? E se, além disso, não tiver mais empregada todos os dias? 
Ok, mas enxugar desse lado, paradoxalmente, prejudica outro. Como a empregada vai sobreviver? 
Se qualificando também. Para isso, ela, como você, precisa saber o que a torna única. Quem não criou essa marca, precisa criar. Que desligue a televisão! Que pare de se anestesiar e se ponha em ação. Imagine que essa empregada doméstica começa a fazer marmitas. Conheci uma que fazia arroz, feijão, bife, mas tinha um diferencial. Conhecia os clientes, sabia quem não gostava de alho, quem era diabético. O sucesso dela era a customização afetiva. Por conversar com as pessoas, ela as conhecia e, por conhecê-las, personalizava. Isso faz diferença porque o valor das coisas não está só no objeto, mas na relação, na cultura. Na fluxonomia, lembra?
Principalmente em tempos de crise… 
Outro ponto importante da crise é que ela não dá mole. Posso estar sendo cruel, mas tempo é energia. Durante a Copa de 2014, fi z uma conta: em cada jogo, 60% da população do Brasil fi cou parada por duas horas. São 27.600 horas de um país gerando o nada. É claro que temos que celebrar. Mas, depois, vamos para a rua fazer algo produtivo. Ensinar, por exemplo. 
O que mais? 
Vou dar outro exemplo de economia do compartilhar. Em Seul, capital da Coreia do Sul, falta estacionamento no centro da cidade. Se fosse em São Paulo, haveria licitação para escolher a construtora que faria novas garagens, anos de obras, gastos estrondosos, corrupção. Seul resolveu diferente. Já que tem muita gente que mora no centro, trabalha em outro bairro e deixa a garagem vazia, fi zeram um aplicativo para identificar essas vagas disponíveis. Quem precisa, usa e paga por isso. O sistema ganha porque cria-se um novo negócio, o estado ganha porque não tem que gastar milhões para fazer mais garagem. E o ambiente não sofre mais impacto.

Algum exemplo parecido no Brasil? 
Há coisas lindas acontecendo. Uma delas é a que cria hortas orgânicas no teto de casas de comunidades carentes. Pense: o morador, pai de família, desempregado, pode estar no bar bebendo e, por falta de autoestima, entre outros problemas, canaliza sua raiva batendo na mulher. Ela, por sua vez, sai para trabalhar e o fi lho fica sozinho. Se alguém vai lá e ensina a fazer horta na laje, esse ciclo pode ser interrompido. Imagine que mais um morador se interessa, a favela faz minicultivos, o supermercado próximo paga por essa produção e tem quantidade sufi ciente para a demanda. Cria-se uma inteligência colaborativa. O homem melhora a autoestima, deixa de bater na mulher. A mulher, aquela empregada que perdeu o emprego, começa a ajudá-lo na horta e fi ca mais tempo com o fi lho. Além disso, não está mais com pressão alta porque está comendo cenoura. E sabe o que mais acontece? O pessoal do prédio vizinho começa a conversar com a comunidade. E não mais acha que ali todos são perigosos. Isso está acontecendo com o projeto Favela Orgânica no Rio de Janeiro.
Podemos ter esperança, então? 
O futuro está cheio de possibilidades. Sabemos que, quando 20% das pessoas mudam, elas conseguem carregar os 80% que permaneciam resistentes. Na prática, quando dois têm entusiasmo, coragem, criatividade, os outros oito olham e pensam “Caraca, eles conseguiram resolver, vou entrar nessa”. Então, sim, podemos ter esperança. Como dizia Peter Drucker, um dos principais gurus do empreendedorismo: “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”.

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Apaixonada por TV, séries, Realities e novelas. Escrevo como fã disso tudo que tanto amo, sendo uma das mais antigas do Tudo Pop.

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